quarta-feira, 22 de julho de 2009

Floripa , Uma ilha de muitos lances


MOUNTAIN VOICES ANO III NÚMERO 17 MAI/JUN 1993 Cr$ 40.000,00
ON THE ROCKS

FLORIPA, A ILHA DE LANCES
Bito Meyer (texto)
Em 1970, quando comecei a praticar montanhismo, algumas caminhadas e tre­pa-pedras, levaram-me aos primeiros cumes e, em pouco tempo, estava decla­mada minha paixão pelas montanhas e escaladas. Naquela época, no Marumbi havia apenas algumas chaminés e artifi­ciais conquistadas, e, pelas técnicas rudi­mentares com que foram abertas, pouco tinham a acrescentar em termos técnicos. Começava a explodir o montanhismo e, com ele, uma nova mentalidade em todo o mundo.
Nosso campo-escola era o Anhangava e formávamos um pequeno grupo de in­teressados em aprender o balé das ro­chas. Em 1976 fiz meus primeiros conta­tos fora do Paraná, conheci o Itatiaia, nossas queridas altas montanhas e fui pa­ra o Rio de Janeiro que, naquela época, era para nós o Yosemite. Em 1977 já fazíamos .......lentos, em movimentos isolados, "lances" de 6 grau, sem saber da polêmica que esse grau causava na Eu­ropa.
Ainda não conhecíamos o termo boulder, procurávamos pelos "lances", peque­nas' pedras onde procurávamos melhorar nossa habilidade. Naquele período ainda escalávamos com as pesadas botas semi-­rígidas e grampear pedrinhas era simples­mente inconcebível. Chegamos ao fim dos anos 70 com muitos cursos ministrados para o Centro Paranaense de Montanhismo' mo, que mesmo por pouco tempo cum­priu a meta para o qual foi criado ensinar um montanhismo técnico.
Em 1980, devido aos estravancos da vida, fui morar em Floripa, com a dor de sair da serra e viver numa ilha sem monta­nhas, sem montanhismo. Adeus escaladas! Cheguei a Florianópolis num dia chuvoso e cinza. Chovera toda a semana mas, as­sim que o sol apareceu, brilharam na mi­nha cara os 100 metros de rocha da Pe­dra Branca, e em pouco tempo percebi que a ilha era um berçário de lances. Em agosto, patrocinados por uma imobiliá­ria e apoiados pelo jornal "O Estado", eu e meu irmão Maurício abrimos a pri­meira via da Pedra Branca. No final do verão de 1981, já conhecíamos a ilha toda, percorríamos os costões atrás de rotas e abrimos vias na Lagoinha do Les­te, Galheta, Matadeiro, Brava, Naufraga­dos, Morro da Cruz, Santinho e outros.
Ainda escalava com minha velha bota semi-rígida e começavam a surgir botas novas para rocha, as ,famosas E.B., mas co­mo não tinha de o'lide tirar uma desmon­tei um Ki-Chute e, com encerado amare­lo, fiz uma botinha. Taquei um Vibram e ela mais parecia uma omelete. Com essa maravilha fiz uma série de lances por to­da a ilha e repeti, logo após sua conquis­ta, a "Pássaros de fogo", no Pão de Aç(j­caro Era 1985 e, naquele mesmo ano, comprei uma Fire maravilhosa.
Somente no último ano em que fi­quei em Floripa um grupo de pessoas co­meçou a escalar comigo; apesar de pregui­çosos e desorganizados, ainda escalam e tenho por eles um grande carinho e ami­zade. Junto com Carlos e Neto, meus companheiros de Curitiba, nesses dois úl­timos anos abrimos mais de 50 itinerários entre falésias e paredes, e naqueles anes os ilhéus criaram a ACEM, associação 'para reunir os interessados que surgiram na ilha.
Quando saí de Florianópolis, em 1988, sabia que tinha feito um trabalho pessoal e especial, motivado apenas pelo meu tesão em escalar, já que na maioria das ve­zes escalava sozinho. Também pelo fato de ter motivado direta e indiretamente pessoas a escalar, além de contribuir para modernizar o montànhismo no Brasil. Mas recentemente, mal-orientados, prova­velmente por seus .instrutores, novos esca­ladores grampearam e rebatizaram algu­mas vias que eu tinha aberto em "top­ rope", no Morro da Cruz, em Florianó­polis. Como alguém que repinta um qua­dro de outro autor, só porque não gostou dos olhos ou de outros detalhes, e muda­-lhe o nome? Sabiam que faziam algo medíocre, mas como não teria ninguém para reclamar, assinaram embaixo. Sabia que isso aconteceria mais cedo ou mais tarde, na real não me importo,apenas retrato aqui como é difícil fazer bem feito, com classe e com ética.